Nuno Álvares Pereira nasceu em Portugal em 24 de junho de 1360. Filho do cavaleiro dos hospitalários, Álvaro Gonçalves Pereira recebeu a educação cavalheiresca, típica dos filhos das famílias nobres de seu tempo.
Juventude Aos treze anos, tornou-se pajem da rainha D. Leonor, tendo sido bem recebido na Corte e acabando por ser, pouco depois, cavaleiro. Em 1376, aos 16 anos, casou-se, por vontade de seu pai, com a jovem e rica viúva, D. Leonor de Alvim. De sua união nasceram três filhos: dois homens, que morreram em tenra idade; e uma menina, Beatriz, a qual mais tarde viria a casar-se com o filho do rei D. João I, D. Afonso, primeiro duque de Bragança.
Condestável por D. João I Em 1383, diante da crise causada pela morte do rei D. Fernando, sem ter deixado filhos varões, seu irmão D. João, Mestre de Avis, viu-se envolvido na luta pela coroa lusitana, que lhe era disputada pelo rei de Castela por ter se casado com a filha do falecido rei. Tomando o partido de D. João, o qual o nomeou Condestável, isto é, comandante supremo do exército, Nuno conduziu o exército português repetidas vezes à vitória, até ser consagrado na batalha de Aljubarrota, em 14 de agosto de 1385, a qual acabou por determinar a resolução do conflito.
A Perspicácia Militar de São Nuno de Santa Maria era acompanhado pela sua espiritualidade
Dotes Militares Os dotes militares de São Nuno eram, no entanto, acompanhados por uma espiritualidade sincera e profunda. O amor pela Eucaristia e pela Virgem Maria eram os alicerces de sua vida interior. O estandarte que elegeu como insígnia pessoal traz as imagens do Crucificado, de Maria e dos cavaleiros de São Tiago e São Jorge. Construiu ainda às suas próprias custas numerosas igrejas e mosteiros, entre os quais se contam o Carmo de Lisboa e a Igreja de Santa Maria da Vitória.
Entrada no Convento Após a morte de sua esposa, no ano 1387, Nuno recusou um novo casamento, tornando-se um modelo de pureza de vida. Quando finalmente alcançou a paz, distribuiu a maior parte de seus bens entre os seus companheiros, antigos combatentes, e acabou por se desfazer totalmente dos demais em 1423, quando decidiu entrar no convento carmelita por ele fundado, tomando então o nome de frei Nuno de Santa Maria.
São Nuno dedicou-se totalmente aos Serviços do Senhor e de Maria
Abandono das Armas Impelido pelo amor, abandonando as armas e o poder, para revestir-se da armadura do Espírito recomendado pela Regra do Carmo, essa era a opção por uma mudança radical de vida em que selava o percurso da fé autêntica que sempre o tinha norteado.
Abandono dos Privilégios O Condestável do rei de Portugal, o comandante supremo do exército e seu guia vitorioso, o fundador e benfeitor da comunidade carmelita, ao ingressar no convento, abriu mão de todos os privilégios para assumir a condição mais humilde, a de frade Donato, dedicando-se totalmente ao serviço do Senhor e de Maria — sua Padroeira que sempre venerou —, e dos pobres, nos quais reconhece o rosto de Jesus.
Páscoa
São Nuno de Santa Maria morreu aos 71 anos de idade. Era o domingo de Páscoa, dia 1 de abril de 1431. Após sua morte, passou imediatamente a ser aclamado “santo” pelo povo que, desde então, começou a chamá-lo de “Santo Condestável”.
Via de Santificação
Nuno Álvares Pereira foi beatificado em 23 de janeiro de 1918 pelo Papa Bento XV através do Decreto “Clementíssimus Deus”, e foi consagrado beato no dia 6 de novembro. O Santo Padre, Papa Bento XVI, durante o Consistório de 21 de fevereiro de 2009, determinou que o beato Nuno fosse inscrito no álbum dos santos no dia 26 de abril de 2009.
Minha oração
“São Nuno, que soube desapegar-se dos cargos para seguir a Deus por inteiro, rogai por nós para que não coloquemos o trabalho ou qualquer outro tipo de coisa acima do Senhor Jesus. Que Ele reine em nossas vidas e de nossas famílias. Amém.”
A Assembleia Sinodal terminou, mas não o Sínodo, que é um processo, nem a Sinodalidade, que é uma forma de ser Igreja. Quatro semanas podem ou não valer muito, mas estou convencido de que o tempo gasto durante a Segunda Sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, que teve lugar na Aula Paulo VI de 2 a 27 de outubro de 2024, com dois dias de retiro prévio, dará frutos, trinta, sessenta ou cem por cento.
O timoneiro
Depois de tudo o que vi, resta-me aquilo a que chamaria o timoneiro, o orientador e a concretude. Os anos ajudam-nos a sedimentar, sobretudo quando vivemos e contemplamos a realidade do ponto de vista de Deus. O timoneiro de tudo o que a Igreja está a viver neste momento não é outro senão o Papa Francisco. Digo-o com base nas suas duas homilias e nos seus dois discursos, na abertura e no encerramento. Na missa da manhã de 2 de outubro, convidou-nos a procurar o caminho a seguir para chegar aonde Deus nos quer levar, tarefa nada fácil, dada a diversidade de proveniências e de ministérios eclesiais dos membros. Aqueles que sentem que perderam ou ganharam não compreendem o apelo de Francisco para que a Assembleia Sinodal seja um lugar de escuta em comunhão, não um parlamento.
A arrogância está presente quando, movidos pela autossuficiência, acreditamos que a nossa é a única forma de ser Igreja, com uma agenda a impor, e desprezamos aqueles que vemos como adversários; isso é superado pela fraternidade em comunhão, que leva a falar espontânea e abertamente, sem medo de rejeição, tornando-se pequenos e querendo estar entre os pequenos, nas periferias, ouvindo a voz do Espírito consolador, imagem do Deus misericordioso, que sabe e quer perdoar sempre e a todos.
O timoneiro procurou que todos remassem juntos e na mesma direção, apesar dos rebeldes que insistem em desafinar para que a sinfonia não soe bem. Na Igreja, ninguém é o que é sem o outro, incluindo o bispo de Roma, que deve também escutar para melhor orientar o leme de um barco em que ninguém falta, um barco sem muros, sem rigidez, que avançará na diversidade, sem condenações, através da experiência concreta que leva a descobrir o Espírito que sopra em todo o lado. Para isso, a Igreja não pode ficar sentada, muda, cega ou estática; temos de escutar o Senhor e sair de nós mesmos para caminhar juntos atrás d´Ele e com Ele.
O orientador
Considero Timothy Radcliffe como um dos grandes mentores da sinodalidade. O dominicano inglês é capaz de fazer uma leitura espiritual para ajudar a avançar nesta forma de ser Igreja a partir da escuta do Espírito Santo, que gera um sentimento de liberdade, que nos permite caminhar juntos e tomar decisões, pensar, falar e escutar sem medo. Só assim a Igreja Católica se pode renovar e responder a novas situações, assumindo “novas formas de ser Igreja que nos permitem estar em comunhão uns com os outros de uma forma mais profunda em Cristo e para Cristo”.
Antes de alguns o fazerem, Radcliffe já tinha avisado que “podemos ficar desiludidos com as decisões do Sínodo”, a quem deu a resposta: “pertençam à Igreja e digam Nós”. De fato, “não precisamos de ter medo do desacordo, porque nele atua o Espírito Santo”, Deus “atua suave e silenciosamente, mesmo quando as coisas parecem estar a correr mal”, como tem feito ao longo da história, “conduzindo-nos ao Reino por caminhos que só Deus conhece. A sua vontade para o nosso bem não pode ser contrariada”. De fato, “este é apenas um sínodo. Haverá outros. Não temos de fazer tudo, apenas tentar dar o próximo passo”.
Haverá sempre perguntas difíceis de responder, uma delas é: como pode a Igreja ser a comunidade dos batizados, todos iguais, e, no entanto, o Corpo de Cristo com diferentes papéis e hierarquias? Uma questão colocada pelo dominicano à Assembleia Sinodal. Para Radcliffe, “muitas pessoas querem que este Sínodo dê um Sim ou um Não imediato sobre várias questões”, daí a decepção de alguns. São aqueles que veem o Sínodo como um espaço “para negociar compromissos ou para bater nos adversários”. Perante isto, uma questão fundamental: “Teremos a coragem de confiar uns nos outros, apesar de alguns fracassos?”
A concretude
Finalmente, descobrir o que já temos de sinodalidade, que é algo que em maior ou menor grau existe, algo que o Arcebispo de Manaus, Cardeal Leonardo Steiner, fez. De fato, a sinodalidade tem a ver com diferentes realidades, entre elas o meio ambiente, já que na “Querida Amazónia, o Papa Francisco dá-nos uma hermenêutica da totalidade que é tremendamente sinodal”. Mas a sinodalidade também se manifesta na caminhada da Igreja na Amazônia. Ali, as mulheres, um dos grandes temas deste processo sinodal, “fizeram avançar as comunidades e hoje fazem avançar as nossas comunidades”.
Além disso, e aqui entra a questão das diaconisas, ele disse que “várias das nossas mulheres são verdadeiras diaconisas, sem terem recebido a imposição das mãos. E a estas diaconisas, gostaríamos de lhes chamar diaconisas, mas para não criar confusão com o ministério ordenado, ainda não encontrámos uma palavra adequada”. A partir daí, sublinhou que “é admirável, admirável, quantas mulheres são responsáveis pela nossa Igreja, é admirável”, mulheres que “estão à frente das comunidades”, ao ponto de que “a nossa Igreja não seria a Igreja que é sem a presença das mulheres”.
São passos que estão a ser dados, talvez não ao ritmo que gostaríamos, mas ao ritmo de todos, um processo que nos deve levar a compreender que “o Sínodo para a Amazônia abriu a possibilidade de ter um Sínodo de Sinodalidade”, e que “a sinodalidade é um caminho sem retorno”, porque “estamos todos a entrar num movimento de ser Igreja, estamos a ser convidados a participar num modo de ser Igreja onde todos aqueles que receberam a graça do batismo e da confirmação, foram revestidos do Espírito Santo e de Jesus, se sentem responsáveis pela missão”.
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
São Narciso foi Bispo de Jerusalém e, quando se deu tal fato, devia ter quase cem anos de idade. Narciso não era judeu e teria nascido no ano 96. Homem austero, penitente, humilde, simples e puro, sabe-se que presidiu com Teófilo de Cesareia a um concílio onde foi aprovada a determinação de se celebrar sempre a Páscoa num Domingo.
Transformação da água em óleo
Eusébio narra que, em certo dia de festa, em que faltou o óleo necessário para as unções litúrgicas, Narciso mandou vir água de um poço vizinho e, com a sua bênção, a transformou em óleo. Conta também as circunstâncias que levaram Narciso a demitir-se das suas funções.
Acusado Falsamente
Para se justificarem de um crime, três homens acusaram o Bispo Narciso de certo ato infame. “Que me queimem vivo — disse o primeiro —, se eu minto”. “E a mim, que me devore a lepra”, disse o segundo. “E que eu fique cego”, acrescentou o terceiro. O desgosto de ser assim caluniado despertou em Narciso o seu antigo desejo pelo recolhimento e, por isso, sem dizer para onde iria, perdoou os caluniadores e saiu de Jerusalém em direção ao deserto.
São Narciso: protegido pela justiça divina
Considerando-o definitivamente desaparecido, deram-lhe por sucessor a Dio, ao qual por sua vez sucederam Germânio e Górdio. Todavia, os três caluniadores não tardaram a sofrer os castigos que em má hora tinham invocado, pois o primeiro pereceu num incêndio com todos os seus, o segundo morreu de lepra e o terceiro cegou à força de tanto chorar o seu pecado.
Páscoa
Alguns anos depois, Narciso reapareceu na cidade episcopal. Nunca tinha sido posta em dúvida a santidade do seu procedimento, por isso foi com imensa alegria que Jerusalém recebeu seu antigo pastor. Segundo diz Eusébio, continuou Narciso a governar a diocese até a idade de 119 anos, auxiliado por um coadjutor chamado Alexandre. Faleceu cerca do ano de 212.
Minha oração
“Pedimos ao padroeiro de Jerusalém, que cuidai dos cristãos naquela região. Fortalecei a fé desse povo e promove novas conversões, grandes conversões. Ajudai o povo para que encontrem na terra de Jesus a sua presença e experiência. Amém!”
O Documento Final votado hoje, aprovado em todos os seus 155 parágrafos, está publicado e não será objeto de uma exortação do Papa: Francisco decidiu que seja imediatamente divulgado para que possa inspirar a vida da Igreja. “O processo sinodal não se encerra com o término da assembleia, mas inclui a fase de implementação” (9). Envolvendo todos no “caminho cotidiano com uma metodologia sinodal de consulta e discernimento, identificando modos concretos e percursos formativos para realizar uma tangível conversão sinodal nas várias realidades eclesiais” (9). No Documento, em particular, é solicitado aos bispos um compromisso intenso em relação à transparência e à prestação de contas, enquanto — como também declarou o cardeal Férnandez, prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé — estão em andamento trabalhos para dar mais espaço e poder às mulheres.
O Papa Francisco proferiu um discurso neste sábado, 26 de outubro, na Sala Paulo VI, no Vaticano, após a votação e aprovação do Documento Final da segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos. O Pontífice sublinhou que o Documento Final representa “o fruto de anos, pelo menos três”, dedicados à escuta do Povo de Deus e reflete o propósito de uma Igreja mais sinodal. “As referências bíblicas que abrem cada capítulo organizam a mensagem cruzando-a com os gestos e as palavras do Senhor Ressuscitado, que nos chama a ser testemunhas do seu Evangelho mais com a vida do que com as palavras”, afirmou Francisco, citando diretamente o documento.
Missão da Igreja no ambiente digital
O documento traz pontos importantes que abordam a missão da Igreja no ambiente digital. Reconhecendo a crescente influência da cultura digital, especialmente entre os jovens, o documento oferece uma visão transformadora para o futuro da evangelização online.
Segundo o documento, cada cristão é chamado a atuar como missionário nos contextos onde vive, incluindo o ambiente digital. No espírito de liberdade do Evangelho, os fiéis são incentivados a anunciar a mensagem cristã em seus círculos digitais, nos quais se encontram inúmeras oportunidades para evangelizar e construir uma cultura inspirada pela fé. A Igreja, porém, é instada a acompanhar e fortalecer esses missionários digitais, sustentando-os com o “pão da Palavra e da Eucaristia” e reconhecendo que seu trabalho não é uma missão individual, mas uma ação de toda a Igreja.
Duas palavras-chave emergem do texto — permeado pela perspectiva e pela proposta de conversão —: “relações” — que é uma maneira de ser Igreja — e “vínculos”, no sentido de um “intercâmbio de dons” entre as Igrejas, vivido de forma dinâmica e, assim, para converter os processos. Justamente as Igrejas locais estão no centro do horizonte missionário, que é o próprio fundamento da experiência de pluralidade da sinodalidade, com todas as estruturas a serviço, em suma, da missão, com o laicato cada vez mais ao centro e protagonista. E, nessa perspectiva, a concretude de estar enraizados em um “lugar” emerge com força no Documento Final. Também é particularmente significativa a proposta apresentada no Documento para que os Dicastérios da Santa Sé possam iniciar uma consulta “antes de publicar documentos normativos importantes” (135).
A estrutura do Documento
O Documento Final é composto por cinco partes (11). A primeira, intitulada: O coração da sinodalidade, é seguida pela segunda parte — Juntos, na barca de Pedro — “dedicada à conversão das relações que edificam a comunidade cristã e dão forma à missão na intersecção de vocações, carismas e ministérios”. A terceira parte — Sobre a tua Palavra — “identifica três práticas intimamente interligadas: discernimento eclesial, processos decisórios, cultura da transparência, da prestação de contas e da avaliação”. A quarta parte — Uma pesca abundante — “delineia a forma como é possível cultivar, de maneira nova, o intercâmbio de dons e o entrelaçamento de vínculos que nos unem na Igreja, em um tempo em que a experiência de enraizamento em um lugar está mudando profundamente”. Finalmente, a quinta parte — Também eu vos envio — “permite olhar para o primeiro passo a ser dado: promover a formação de todos para a sinodalidade missionária”. Em particular, observa-se que o desenvolvimento do Documento é guiado pelos relatos evangélicos da Ressurreição (12).
As feridas do Ressuscitado continuam a sangrar
A Introdução do Documento (1-12) esclarece desde o início a essência do Sínodo como uma “experiência renovada daquele encontro com o Ressuscitado que os discípulos viveram no Cenáculo na noite de Páscoa” (1). “Contemplando o Ressuscitado” — afirma o Documento — “vislumbramos também os sinais de Suas feridas (…) que continuam a sangrar no corpo de muitos irmãos e irmãs, inclusive devido a nossas próprias falhas. O olhar voltado ao Senhor não nos afasta dos dramas da história, mas nos abre os olhos para reconhecer o sofrimento que nos rodeia e nos penetra: os rostos das crianças aterrorizadas pela guerra, o choro das mães, os sonhos desfeitos de tantos jovens, os refugiados que enfrentam jornadas terríveis, as vítimas das mudanças climáticas e das injustiças sociais” (2). O Sínodo, ao lembrar as “muitas guerras” em curso, uniu-se aos “repetidos apelos do Papa Francisco pela paz, condenando a lógica da violência, do ódio, da vingança” (2). Além disso, o caminho sinodal é marcadamente ecumênico — “orienta-se para uma unidade plena e visível dos cristãos” (4) — e “constitui um verdadeiro ato de recepção adicional” do Concílio Vaticano II, prolongando sua “inspiração” e renovando “para o mundo de hoje a sua força profética” (5). Nem tudo foi fácil, reconhece o Documento: “Não escondemos que experimentamos em nós dificuldades, resistências à mudança e a tentação de fazer prevalecer nossas próprias ideias sobre a escuta da Palavra de Deus e a prática do discernimento” (6).
O coração da sinodalidade
A primeira parte do Documento (13-48) se abre com reflexões compartilhadas sobre a “Igreja Povo de Deus, sacramento de unidade” (15-20) e sobre as “raízes sacramentais do Povo de Deus” (21-27). É um fato que, justamente “graças à experiência dos últimos anos”, o significado dos termos “sinodalidade” e “sinodal” tenha “sido mais bem compreendido e, ainda mais, vivido” (28). E “cada vez mais, esses termos têm sido associados ao desejo de uma Igreja mais próxima das pessoas e mais relacional, que seja casa e família de Deus” (28). “Em termos simples e sintéticos, pode-se dizer que a sinodalidade é um caminho de renovação espiritual e de reforma estrutural para tornar a Igreja mais participativa e missionária, para torná-la, assim, mais capaz de caminhar com cada homem e mulher, irradiando a luz de Cristo” (28). Na consciência de que a unidade da Igreja não é uniformidade, “a valorização dos contextos, das culturas e das diversidades, e das relações entre eles, é uma chave para crescer como Igreja sinodal missionária” (40). Com o fortalecimento das relações também com as demais tradições religiosas, em particular “para construir um mundo melhor” e em paz (41).
A conversão das relações
“A necessidade de uma Igreja mais capaz de nutrir as relações: com o Senhor, entre homens e mulheres, nas famílias, nas comunidades, entre todos os cristãos, entre grupos sociais, entre religiões, com a criação” (50) é a constatação que abre a segunda parte do Documento (49-77). E “não faltou também quem compartilhou o sofrimento de se sentir excluído ou julgado” (50). “Para ser uma Igreja sinodal, é necessária, portanto, uma verdadeira conversão relacional. Devemos aprender novamente com o Evangelho que o cuidado com as relações e os vínculos não é uma estratégia ou instrumento para uma maior eficácia organizacional, mas é o modo como Deus Pai se revelou em Jesus e no Espírito” (50). As “recorrentes expressões de dor e sofrimento por parte de mulheres de todas as regiões e continentes, sejam leigas ou consagradas, durante o processo sinodal, revelam o quanto frequentemente falhamos em fazer isso” (52). Em particular, “o chamado à renovação das relações no Senhor Jesus ressoa na pluralidade de contextos” ligados “ao pluralismo das culturas”, com, às vezes, “sinais de lógicas relacionais distorcidas e até mesmo opostas às do Evangelho” (53). O ponto é direto: “Nessa dinâmica encontram-se as raízes dos males que afligem nosso mundo” (54), mas “o fechamento mais radical e dramático é aquele em relação à própria vida humana, que leva ao descarte de crianças, ainda no ventre materno, e dos idosos” (54).
Ministérios para a missão
“Carismas, vocação e ministérios para a missão” (57-67) estão no centro do Documento, que visa à participação mais ampla de leigas e leigos. O ministério ordenado é “a serviço da harmonia” (68) e, em especial, “o ministério do bispo” é “unir em unidade os dons do Espírito” (69-71). Entre diversas questões, foi constatado que “a relação constitutiva do Bispo com a Igreja local não parece hoje suficientemente clara no caso dos Bispos titulares, como os Representantes pontifícios e aqueles que servem na Cúria Romana”. Junto com o bispo estão “presbíteros e diáconos” (72-73), para uma “colaboração entre os ministros ordenados na Igreja sinodal” (74). É significativa, ainda, a experiência da “espiritualidade sinodal” (43-48), com a certeza de que “se faltar a profundidade espiritual pessoal e comunitária, a sinodalidade se reduz a um expediente organizacional” (44). Por isso, destaca-se, “praticado com humildade, o estilo sinodal pode tornar a Igreja uma voz profética no mundo de hoje” (47).
A conversão dos processos
Na terceira parte do Documento (79-108), é imediatamente destacado que “na oração e no diálogo fraterno, reconhecemos que o discernimento eclesial, o cuidado dos processos decisórios e o compromisso de prestar contas de nossas ações e de avaliar os resultados das decisões tomadas são práticas com as quais respondemos à Palavra que nos indica os caminhos da missão” (79). Em particular, “essas três práticas estão intimamente interligadas. Os processos decisórios necessitam do discernimento eclesial, que requer escuta em um clima de confiança, que a transparência e a prestação de contas sustentam. A confiança deve ser mútua: aqueles que tomam as decisões precisam poder confiar e ouvir o Povo de Deus, que, por sua vez, necessita poder confiar em quem exerce a autoridade” (80). “O discernimento eclesial para a missão” (81-86), na verdade, “não é uma técnica organizativa, mas uma prática espiritual a ser vivida na fé” e “nunca é a afirmação de um ponto de vista pessoal ou de grupo, nem se resolve na simples soma de opiniões individuais” (82). “A articulação dos processos decisórios” (87-94), “transparência, prestação de contas, avaliação” (95-102), “sinodalidade e organismos de participação” (103-108) são pontos centrais das propostas contidas no Documento, surgidas da experiência do Sínodo.
A conversão dos laços
“Em um tempo em que muda a experiência dos lugares onde a Igreja está enraizada e peregrina, é necessário cultivar de novas formas a troca de dons e a interligação dos laços que nos unem, sustentados pelo ministério dos Bispos em comunhão entre si e com o Bispo de Roma”: esta é a essência da quarta parte do Documento (109-139). A expressão “enraizados e peregrinos” (110-119) recorda que “a Igreja não pode ser compreendida sem o enraizamento em um território concreto, em um espaço e em um tempo onde se forma uma experiência compartilhada de encontro com Deus que salva” (110). Também com uma atenção aos fenômenos da “mobilidade humana” (112) e da “cultura digital” (113). Nessa perspectiva, “caminhar juntos nos diferentes lugares como discípulos de Jesus na diversidade dos carismas e dos ministérios, assim como na troca de dons entre as Igrejas, é um sinal eficaz da presença do amor e da misericórdia de Deus em Cristo” (120). “O horizonte da comunhão na troca de dons é o critério inspirador das relações entre as Igrejas” (124). Daqui surgem os “laços pela unidade: Conferências episcopais e Assembleias eclesiais” (124-129). Particularmente significativa é a reflexão sinodal sobre “o serviço do bispo de Roma” (130-139). Justamente no estilo da colaboração e da escuta, “antes de publicar documentos normativos importantes, os Dicastérios são exortados a iniciar uma consulta das Conferências episcopais e dos organismos correspondentes das Igrejas Orientais Católicas” (135).
Formar um povo de discípulos missionários
“Para que o santo Povo de Deus possa testemunhar a todos a alegria do Evangelho, crescendo na prática da sinodalidade, necessita de uma formação adequada: antes de tudo, à liberdade de filhos e filhas de Deus na sequela de Jesus Cristo, contemplado na oração e reconhecido nos pobres”, afirma o Documento em sua quinta parte (140-151). “Uma das solicitações que emergiram com maior força e de todos os lados ao longo do processo sinodal é que a formação seja integral, contínua e compartilhada” (143). Também nesse campo retorna a urgência da “troca de dons entre vocações diferentes (comunhão), sob a perspectiva de um serviço a ser prestado (missão) e em um estilo de envolvimento e de educação à corresponsabilidade diferenciada (participação)” (147). E “um outro âmbito de grande relevância é a promoção em todos os ambientes eclesiais de uma cultura de proteção (safeguarding), para tornar as comunidades lugares cada vez mais seguros para os menores e as pessoas vulneráveis” (150). Finalmente, “também os temas da doutrina social da Igreja, do compromisso pela paz e justiça, do cuidado da casa comum e do diálogo intercultural e inter-religioso devem ter maior difusão no Povo de Deus” (151).
Entrega a Maria
“Vivendo o processo sinodal – é a conclusão do Documento (154) – tomamos nova consciência de que a salvação a ser recebida e anunciada passa pelas relações. Vive-se e testemunha-se juntas. A história nos aparece tragicamente marcada pela guerra, pela rivalidade pelo poder, por mil injustiças e opressões. Contudo, sabemos que o Espírito colocou no coração de cada ser humano um desejo profundo e silencioso de relações autênticas e de laços verdadeiros. A própria criação fala de unidade e de compartilhamento, de variedade e interligação entre diferentes formas de vida.” O texto se conclui com a oração à Virgem Maria pela entrega “dos resultados deste Sínodo: ‘Ensina-nos a ser um Povo de discípulos missionários que caminham juntos: uma Igreja sinodal’” (155).
Documento final
Publicamos, abaixo, a primeira versão do documento. O texto está em italiano. Publicaremos a versão em português tão logo seja publicada a tradução oficial:
Agora podemos dizer que terminou a Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, não o Sínodo, que é um processo, não a Sinodalidade, que é um modo de ser Igreja. O final coincidiu com uma missa na Basílica de São Pedro, na qual o Papa Francisco foi mais uma vez preciso nas suas palavras, como tem sido nos seus discursos desde 2 de outubro.
O modo de ser Igreja
“Irmãos e irmãs: não uma Igreja sentada, mas uma Igreja de pé. Não uma Igreja muda, mas uma Igreja que ouve o grito da humanidade. Não uma Igreja cega, mas uma Igreja iluminada por Cristo, que leva a luz do Evangelho aos outros. Não uma Igreja estática, mas uma Igreja missionária, que caminha com o Senhor pelas estradas do mundo”, sublinhou na sua homilia.
Francisco começou as suas palavras falando da figura de Bartimeu, “um marginal sem esperança que, no entanto, ao ouvir Jesus passar, começa a gritar-lhe”. Nesta situação, “a única coisa que lhe resta é isso: gritar a sua própria dor e levar a Jesus o seu desejo de recuperar a vista. E enquanto todos o repreendem porque a sua voz os incomoda, Jesus para. Porque Deus ouve sempre o grito dos pobres, e nenhum grito de dor lhe passa despercebido”.
Não ficar parado
No final da Assembleia Sinodal, um momento de ação de graças, o Papa apelou a uma pausa no que acontece a Bartimeu, que se senta a mendigar. Esta é, segundo Francisco, a postura típica de “uma pessoa fechada na sua própria dor, sentada à beira da estrada, como se nada mais lhe restasse do que esperar receber alguma coisa dos muitos peregrinos que passavam pela cidade de Jericó por ocasião da Páscoa”. Perante esta posição, afirma que “para viver verdadeiramente não podemos ficar sentados: viver é sempre mover-se, caminhar, sonhar, fazer projetos, abrir-se ao futuro”.
A partir daí, sublinhou que “o cego Bartimeu representa também aquela cegueira interior que nos bloqueia, que nos faz ficar parados, imóveis à margem da vida, sem esperança”, uma reflexão que devemos fazer pessoalmente e como Igreja. Isto porque “ao longo do caminho, muitas coisas podem tornar-nos cegos, incapazes de reconhecer a presença do Senhor, incapazes de enfrentar os desafios da realidade e, por vezes, inadequados para saber responder às muitas questões que nos interpelam, como Bartimeu faz com Jesus”.
Não nos acomodarmos ao nosso próprio mal-estar
O Papa pediu-nos para não ficarmos sentados perante as questões, os desafios e as urgências da evangelização e as muitas feridas que afligem a humanidade, não podemos ficar sentados. “Uma Igreja que, quase sem se dar conta, se afasta da vida e se coloca à margem da realidade, é uma Igreja que corre o risco de permanecer na cegueira e de se acomodar no seu próprio mal-estar”, disse o Papa. E, continuou, “se permanecermos imóveis na nossa cegueira, continuaremos a não ver as nossas urgências pastorais e os muitos problemas do mundo em que vivemos”.
Perante isto, apelou a recordar que “o Senhor passa, o Senhor passa sempre e para, para tomar conta da nossa cegueira”. Referindo-se ao Sínodo, pediu que isso nos impulsione “a ser a Igreja como Bartimeu, isto é, a comunidade dos discípulos que, ouvindo passar o Senhor, se apercebe do choque da salvação, se deixa despertar pela força do Evangelho e começa a gritar-Lhe. E fá-lo acolhendo o grito de todos os homens e mulheres da terra: o grito daqueles que querem descobrir a alegria do Evangelho e daqueles que se afastaram; o grito silencioso dos indiferentes; o grito dos que sofrem, dos pobres e dos marginalizados; a voz quebrada daqueles que nem sequer têm força para gritar a Deus, porque não têm voz ou porque se resignaram”. Por isso, afirmou com veemência que “não precisamos de uma Igreja paralisada e indiferente, mas de uma Igreja que acolhe o grito do mundo e suja as mãos para o servir”.
Ser capaz de seguir Jesús
Num segundo elemento, Bartimeu acaba por seguir Jesus no caminho, ou seja, torna-se seu discípulo. Agora, Bartimeu “pode ver o Senhor, pode reconhecer a ação de Deus na sua vida e, finalmente, pode segui-lo”. Algo que aplica às nossas vidas: “quando nos sentamos e nos acomodamos, quando, como Igreja, não encontramos a força, a coragem e a audácia para nos levantarmos e voltarmos a pôr-nos a caminho, lembremo-nos de regressar sempre ao Senhor e ao seu Evangelho”.
Para Francisco, “sempre e de novo, quando ele passa, devemos escutar o seu chamamento, que nos põe de pé e nos faz sair da nossa cegueira. E depois segui-lo de novo, caminhar com ele ao longo do caminho”. Em “segui-lo ao longo do caminho”, reconhece uma imagem da Igreja sinodal: “o Senhor chama-nos, levanta-nos quando estamos abatidos ou caídos, dá-nos uma nova visão, para que, à luz do Evangelho, possamos ver as preocupações e os sofrimentos do mundo; e assim, postos de pé pelo Senhor, experimentamos a alegria de o seguir ao longo do caminho”.
Não caminhar por conta própria
Por isso, apelou a que nos lembremos sempre: “não caminhar sozinhos ou segundo os critérios do mundo, mas caminhar juntos atrás d’Ele e com Ele”. Refletindo sobre o restauro da relíquia da antiga Cátedra de São Pedro, apelou a que se recordasse que “esta é a cátedra do amor, da unidade e da misericórdia, segundo o mandato que Jesus deu ao Apóstolo Pedro, de não dominar os outros, mas de os servir na caridade. E, olhando para o majestoso baldaquino de Bernini, mais resplandecente do que nunca, redescobrimos que ele enquadra o verdadeiro ponto focal de toda a Basílica, ou seja, a glória do Espírito Santo”.
Concluiu dizendo que “esta é a Igreja sinodal: uma comunidade cujo primado está no dom do Espírito, que nos torna todos irmãos em Cristo e nos eleva até Ele”. A partir daí, apelou a prosseguir “com confiança o nosso caminho juntos”, recordando as palavras do Evangelho: “Coragem, levanta-te! Ele chama-te”, e convidou-nos a “pôr de lado o manto da resignação, entregar ao Senhor a nossa cegueira, levantar-nos e levar a alegria do Evangelho pelas estradas do mundo”.
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
Após três anos à escuta do Povo de Deus e à escuta do Espírito Santo para compreender melhor como ser uma “Igreja sinodal”, o Papa Francisco se dirigiu aos participantes da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidad e à Igreja toda para reconhecer que “ao convocar a Igreja de Deus em Sínodo, eu estava ciente de que precisava de vocês, Bispos e testemunhas do caminho sinodal”.
O bispo de Roma precisa praticar a escuta
Ele disse que também o bispo de Roma, “precisa praticar a escuta, na verdade quer praticar a escuta, para poder responder à Palavra que se repete a ele todos os dias: Confirmai vossos irmãos e irmãs… Pastoreie minhas ovelhas”. Francisco afirmou que sua tarefa, “é salvaguardar e promover – como nos ensina São Basílio – a harmonia que o Espírito continua a difundir na Igreja de Deus, nas relações entre as Igrejas, apesar de todas as lutas, tensões e divisões que marcam seu caminho rumo à plena manifestação do Reino de Deus”.
“Todos, na esperança de que não falte ninguém. Todos, todos! Ninguém de fora, todos”, sublinhou, colocando como palavra-chave a harmonia, que foi o que o Espírito faz a manhã de Pentecostes, “harmonizar todas essas diferenças, todas essas línguas…”, uma dinâmica que ele vê presente no Concílio Vaticano II. Francisco insistiu em que a graça de Deus, “por meio de seu Espírito, sussurra palavras de amor no coração de cada um. É-nos dado amplificar a voz desse sussurro, sem obstruí-la; abrir portas, sem erguer muros”. Nesse ponto, o Papa denunciou ‘como fazem mal as mulheres e os homens da Igreja quando erguem muros, como fazem mal!”.
A rigidez é um pecado
Insistindo no todos, o Papa disse que “não devemos nos comportar como ‘distribuidores da Graça’ que se apropriam do tesouro amarrando suas mãos ao Deus misericordioso”, lembrando o perdão pedido no início da Assembleia Sinodal “sentindo vergonha, reconhecendo que somos todos misericordiosos”. Ele citou o poema de Madeleine Delbrêl, a mística das periferias, que exortava: “Acima de tudo, não sejam rígidos”, afirmando que “a rigidez é um pecado, é um pecado que às vezes atinge clérigos, homens e mulheres consagrados”. Os versos que ele leu “podem se tornar a música de fundo com a qual daremos as boas-vindas ao Documento Final. E agora, à luz do que emergiu do caminho sinodal, há e haverá decisões a serem tomadas”.
Neste tempo de guerras, ele chamou a “ser testemunhas da paz, aprendendo também a dar forma real à convivência das diferenças”. Isso levou o Papa a dizer que não pretende publicar uma “exortação apostólica, o que aprovamos é suficiente. No Documento já há indicações muito concretas que podem ser um guia para a missão das Igrejas, nos diferentes continentes, nos diferentes contextos: por isso estou colocando-o à disposição de todos agora, por isso disse que deveria ser publicado. Quero, dessa forma, reconhecer o valor do caminho sinodal concluído, que, por meio deste Documento, entrego ao santo povo fiel de Deus”.
Ouvir, reunir, discernir, decidir e avaliar
Ele chamou os aos dez “Grupos de Estudo”, a trabalhar com liberdade, “para me oferecer propostas, há necessidade de tempo, a fim de chegar a escolhas que envolvam toda a Igreja”, mostrando seu desejo de “ouvir os Bispos e as Igrejas a eles confiadas”. Algo que segundo ele, “não é a maneira clássica de adiar infinitamente as decisões. É o que corresponde ao estilo sinodal com o qual o ministério petrino também deve ser exercido: ouvir, reunir, discernir, decidir e avaliar. E, nessas etapas, são necessárias pausas, silêncios e orações. É um estilo que estamos aprendendo juntos, um pouco de cada vez. O Espírito Santo nos chama e nos apoia nesse aprendizado, que devemos entender como um processo de conversão”, confiando na ajuda da Secretaria Geral do Sínodo e todos os Dicastérios da Cúria.
“O Documento é um presente para todo o povo fiel de Deus, na variedade de suas expressões. É óbvio que nem todos o lerão: serão sobretudo os senhores, juntamente com muitos outros, que tornarão acessível o que ele contém nas Igrejas locais. O texto, sem o testemunho da experiência, perderia muito de seu valor”, disse Francisco.
Escuta, diálogo e reconciliação para alcançar a paz
Ele chamou a “testemunhar que é possível caminhar juntos na diversidade, sem condenar uns aos outros”. Junto com isso, o Papa, lembrando que “viemos de todas as partes do mundo, marcadas pela violência, pobreza e indiferença”, ele fez ver que “juntos, com a esperança que não decepciona, unidos no amor de Deus espalhado em nossos corações, podemos não apenas sonhar com a paz, mas nos comprometer com todas as nossas forças para que, talvez sem falar tanto em sinodalidade, a paz seja alcançada por meio de processos de escuta, diálogo e reconciliação. A igreja sinodal para a missão agora precisa que as palavras compartilhadas sejam acompanhadas de ações. E este é o caminho”.
“Tudo isso é um dom do Espírito Santo: é Ele quem cria a harmonia, é Ele quem é a harmonia”, ressaltou, fazendo um convite a ler o tratado de São Basílio sobre o Espírito Santo, onde aparece como harmonia. Daí, o Papa pediu “que a harmonia continue mesmo quando sairmos desta sala, e que o Sopro do Ressuscitado nos ajude a compartilhar os dons que recebemos”. Antes de agradecer, o Papa lembrou as palavras de Madeleine Delbrêl: “há lugares onde o Espírito sopra, mas há um Espírito que sopra em todos os lugares”.
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
A Assembleia Sinodal do Sínodo da Sinodalidade terminou, só falta a missa de encerramento neste domingo na Basílica de São Pedro. Uma vez concluídos os trabalhos, alguns dos que podem ser considerados os principais atores do atual processo sinodal se fizeram presentes em coletiva de imprensa: o Secretário Geral da Secretaria do Sínodo, Cardeal Mario Grech, o Relator Geral, Cardeal Jean-Claude Hollerich, S.I., uma das presidentas delegadas, Ir. María de los Dolores Palencia, e os secretários especiais, Padre Giacomo Costa e Mons. Riccardo Battocchio.
Início da fase de implementação
Um encontro com os jornalistas que começou com o agradecimento do prefeito do Dicastério para a Comunicação, Paolo Ruffini, por tantos dias de trabalho, insistindo que o Sínodo continua, que já está na fase de implementação, como o Papa havia indicado alguns minutos antes, momento em que também disse que não publicaria uma exortação pós-sinodal, mas que seguiria um documento que, nas palavras de Rufffini, é fruto de um imenso trabalho.
Em resposta às perguntas dos jornalistas, o Cardeal Grech afirmou que o papel de guiar a Igreja é do pastor, algo compartilhado com os padres e os leigos. O secretário do Sínodo lembrou a existência de comunidades na Europa onde a presença do sacerdote é muito limitada, de modo que já é uma experiência que as comunidades sejam lideradas por leigos, enfatizando que não é uma resolução da assembleia sinodal, que aprecia esses ministérios e espera continuar a reconhecer esses dons.
Com relação à não publicação de uma exortação, ele disse que isso não significa que não haverá momentos em que o Papa falará diretamente sobre questões discutidas e propostas na assembleia. Isso se junta ao fato de que a sinodalidade é algo que toca a todos. É algo previsto na Episcopalis Communio, lembrou Battochio, que falou que o texto dá orientações em algumas situações.
Sobre a questão da ordenação de diaconisas, que foi muito discutida na imprensa, o Cardeal Hollerich, considerando o assunto muito delicado, insistiu que o Papa aceitou todo o documento, que diz que essa questão continuará a ser estudada, enfatizando o papel das mulheres ao longo da história e que a comissão para o diaconato feminino continuará a estudar uma questão que ainda está em aberto.
Os 10 grupos de estudo não significa adiar decisões
Com relação aos 10 grupos de estudo que foram criados, Battochio falou sobre a participação de não clérigos na formação nos seminários. Giacomo Costa destacou as fortes conexões entre os grupos de estudo, enfatizando que, em alguns tópicos, o Papa quer ouvir o maior número possível de bispos. Continuar o trabalho desses grupos não significa deixar as coisas de lado ou adiar decisões, enfatizou o jesuíta. Há muitas questões a serem tratadas nesses grupos, disse Hollerich, grupos chamados pelo Papa para trabalhar sinodalmente, de acordo com Grech, que insistiu que não há bispos sem pessoas, um bispo tem que ouvir e levar a voz de seu povo à conferência episcopal. Esses são grupos para os quais os membros do Sínodo puderam fazer contribuições, disse Maria Dolores Palencia, por meio de um diálogo sinodal com possíveis contribuições que permitirão ao Papa ter uma visão mais ampla e completa.
O documento é importante, mas muito mais importante é assumir esse estilo sinodal nas igrejas locais, como uma chave para orientar outras questões, segundo Grech. Não se pode esquecer a diversidade de contextos e culturas e que esta não é uma reunião política para alcançar a maioria, mas um discernimento em conjunto, movido por um clima de alegria, o que o levou a dizer que “caminhamos juntos e sabemos que continuaremos caminhando juntos”, sendo o desafio agora compartilhar essa experiência para ser uma verdadeira igreja sinodal em missão. Foi uma experiência que nos permitiu ampliar o nosso olhar, disse Battochio, que enfatizou o fato de devolver às igrejas, por meio do documento, as experiências vividas e os pontos que podem ser fermento, que podem parecer menores, mas que podem fazer crescer essa dimensão missionária, por meio do testemunho de uma nova realidade de encontro.
Abrir-se para o outro
A assembleia nos ajudou a perceber que não podemos nos fechar em nossas próprias realidades, que não podemos construir muros, disse Giacomo Costa. Algo que se concretiza, por exemplo, no caso dos migrantes, uma realidade que aparece no Documento Final. Sobre esse ponto, Dolores Palencia lembrou que a assembleia refletiu sobre a importância das redes que estão sendo tecidas entre as igrejas e entre as conferências episcopais, nesse campo, porque a migração está transcendendo todas as fronteiras, é algo que exige profundo respeito, diálogo inter-religioso, abertura para uma nova visão.
A estrutura do Sínodo dos Bispos é algo que transcende a Assembleia Sinodal, disse Grech, lembrando que este Sínodo envolveu todos os batizados desde 2021, um aspecto abordado pelo Papa em seu discurso de abertura, onde ele pediu para superar o agora é a nossa vez e desafiou a fazer uma sinfonia a serviço da misericórdia de Deus de acordo com os diferentes ministérios e carismas.
Ministerialidade para reconhecer os carismas
Com relação à ministerialidade, Batocchio disse que não se trata de substituir a falta de ministros ordenados, mas de reconhecer os carismas de cada um e torná-los disponíveis a todos, partindo de contextos concretos que levam a novas figuras ministeriais. Para Hollerich, trata-se de analisar como a comunidade pode viver a fé em conjunto, sabendo que há coisas que podem ser feitas pelos leigos, ser mais criativos.
“Não podemos esperar que tudo tenha sido definido de forma clara e definitiva, há questões que precisam ser mais aprofundadas“, disse Grech. O secretário do Sínodo agradeceu aos jornalistas, “porque vocês também nos ajudam a proclamar o Evangelho”, ajudando a traduzir a linguagem para que as pessoas possam entendê-la, reconhecendo que “chegamos até aqui também com a ajuda de todos vocês”.
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
Depois de quase um mês de intenso trabalho, além de um longo processo de três anos, em que se avançou, às vezes com dificuldade e risco, o documento reconhece a resistência, foi publicado o Documento Final da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade, “um tempo para contemplar o Ressuscitado e ver as feridas do mundo”. Um texto fundamental, dado que o Papa anunciou que não terá exortação pós-sinodal.
Todo o povo de Deus é sujeito do anúncio do Evangelho.
Um documento que dá um novo passo na vida da Igreja, a partir de “um retorno à fonte”, como diz o texto em suas primeiras palavras, depois de muitos passos dados por muitas pessoas, porque “todo o povo de Deus é sujeito do anúncio do Evangelho“. Em um processo sinodal que vai além da Assembleia Sinodal, um exemplo disso são os 10 grupos de estudo que foram criados e a insistência em que a fase de implementação está começando agora, chamando os participantes a “serem missionários da sinodalidade”. Para isso, “o Espírito Santo nos impulsiona a avançar juntos no caminho da conversão pastoral e missionária, que implica uma profunda transformação das mentalidades, das atitudes e das estruturas eclesiais”.
O povo de Deus no coração da sinodalidade
O texto tem como ponto de partida o coração da sinodalidade, o Povo de Deus, que caminha em comunhão dos fiéis, das Igrejas, dos bispos, no fundamento do ministério petrino e nos pobres. É a partir desse coração da sinodalidade que o Espírito Santo nos chama à conversão, atitude decisiva para sermos cristãos, para sermos discípulos. Todo o caminho sinodal “se desenvolveu à luz do magistério do Concílio” e “está colocando em prática o que o Concílio ensinou sobre a Igreja como Mistério e Povo de Deus”. A sinodalidade está enraizada nos sacramentos da Iniciação Cristã, não é um fim em si mesma, ela aponta para a missão e a impulsiona, o que tem a ver com o estilo, as estruturas, os processos e os eventos sinodais, o que leva à reflexão sobre a autoridade dos pastores.
Na sinodalidade, a unidade leva à harmonia, sabendo que os processos nem sempre são respeitados, à unidade dos carismas e ministérios, das Igrejas locais e seu patrimônio, dos povos, línguas, ritos, disciplinas, heranças teológicas e espirituais, vocações, carismas e ministérios a serviço do bem comum. Todos os contextos, culturas, diversidades e relacionamentos são valorizados como “a chave para crescer como uma Igreja sinodal missionária e caminhar sob o impulso do Espírito Santo em direção à unidade visível dos cristãos”, para se abrir a novas perspectivas. Pois “a sinodalidade é, acima de tudo, uma disposição espiritual que permeia a vida cotidiana dos batizados e todos os aspectos da missão da Igreja”. Isso significa fazer da sinodalidade uma profecia social na prática dos relacionamentos.
A conversão de relacionamentos
A conversão é abordada em três dimensões, seguindo o esboço do Instrumentum Laboris: conversão de relacionamentos, de processos e de vínculos. Novas relações, evitando exclusões, assumindo as atitudes de Jesus, em um bom entendimento entre homens e mulheres, reconhecendo as riquezas de cada contexto, buscando a paz e a superação de todo tipo de mal por meio da prática do perdão e da escuta e do acolhimento dos marginalizados e excluídos. As relações entre carismas, vocações e ministérios em vista da missão e da unidade, dada a participação comum no mesmo Batismo, que confere a todos “igual dignidade no Povo de Deus”, recordando os obstáculos encontrados pelas mulheres “para obter um reconhecimento mais pleno de seus carismas, de sua vocação e de seu lugar nos diversos âmbitos da vida da Igreja”. Isso também se aplica às crianças e aos jovens, que têm uma contribuição a dar para a renovação sinodal da Igreja.
Para esse fim, deve-se promover a corresponsabilidade na missão de todos os batizados. O papel dos esposos, da vida consagrada e da teologia é mencionado, sublinhando que “a missão envolve todos os batizados“. O texto faz referência ao ministério ordenado, “a serviço do anúncio do Evangelho e da edificação da comunidade eclesial”, aos bispos, princípio visível de unidade e vínculo de comunhão com todas as Igrejas, em um serviço na, com e para a comunidade. Junto com eles, os sacerdotes e os diáconos, chamados a colaborar e a estar juntos em resposta às necessidades da comunidade e da missão, favorecendo a escuta e a participação dos leigos.
A conversão de processos
A conversão dos processos baseia-se no discernimento, na prestação de contas e na avaliação do resultado das decisões. Tudo isso em vista de sustentar e orientar a missão da Igreja, sabendo que “o discernimento eclesial não é uma técnica organizacional, mas uma prática espiritual a ser vivida na fé”, que parte da escuta da Palavra de Deus e se desenvolve por etapas, em um contexto concreto, e a partir de vários enfoques e metodologias, sendo necessária uma articulação desses processos decisórios, em uma corresponsabilidade diferenciada, que os leve a ser frutíferos e a contribuir “para o progresso do Povo de Deus em uma perspectiva participativa”.
A partir daí, fala-se em transparência, a fim de gerar confiança e credibilidade; responsabilidade, nas ações e decisões; e avaliação dos resultados da missão. Para isso, são criados vários instrumentos e mecanismos, diferentes órgãos participativos, que garantem a adoção de uma metodologia de trabalho sinodal, favorecendo “um maior envolvimento de mulheres, jovens e pessoas que vivem em condições de pobreza ou marginalização“.
A conversão de vínculos
Sobre a conversão dos vínculos, o ponto de partida é que “a Igreja não pode ser entendida sem estar enraizada em um território, espaço e tempo específicos”, sem ignorar a nova realidade social marcada pelo contexto urbano, pela mobilidade humana, pela cultura digital, alertando que “as redes sociais podem ser usadas para interesses econômicos e políticos que, manipulando as pessoas, difundem ideologias e geram polarizações agressivas“, o que “exige que dediquemos recursos aos encontros digitais”. Também reflete sobre o significado e a dimensão da Igreja local, vista como uma casa, acolhedora e inclusiva, e as articulações que dela fazem parte, como a paróquia e outras instituições e organizações.
A Igreja é proposta “como uma rede de relações através da qual circula e promove a profecia da cultura do encontro, da justiça social, da inclusão dos grupos marginalizados, da fraternidade entre os povos, do cuidado com a casa comum”, o que requer a partilha dos bens, a troca de dons “rumo à unidade plena e visível entre todas as Igrejas e Comunhões cristãs”. Em uma Igreja sinodal com ritmos diferentes, na qual as conferências episcopais e as assembleias eclesiais são vistas como elos para a unidade, destacando a riqueza das assembleias continentais realizadas durante o processo sinodal. O Documento apresenta as modalidades com as quais o Bispo de Roma exerce seu ministério à luz da sinodalidade, sua relação com as Igrejas locais e com as outras Igrejas, fazendo várias propostas para avançar nesse caminho, que se baseiam em uma “sadia descentralização”. Nesse sentido, a intensidade do impulso ecumênico é sublinhada como fruto do atual Sínodo.
Chamado para a missão
O último capítulo é um chamado à missão, para a qual somos enviados como discípulos missionários, pois a sinodalidade “implica uma profunda consciência vocacional e missionária, fonte de um estilo renovado nas relações eclesiais, de novas dinâmicas participativas e de discernimento eclesial, bem como de uma cultura de avaliação, que não pode ser estabelecida sem o acompanhamento de processos formativos específicos”. Isso requer uma formação “integral, contínua e compartilhada”, que vai além do conhecimento teórico. Isso requer atenção aos espaços e práticas formativas, bem como aos ambientes e recursos, e que sejam realizados na perspectiva da comunhão, da missão e da participação. Destaca-se a importância de moldar a formação dos seminaristas em um estilo sinodal, de formar para o ambiente digital e para a cultura da tutela e da proteção, bem como para a doutrina social da Igreja, o compromisso com a paz e a justiça, o cuidado da casa comum e o diálogo intercultural e inter-religioso.
Uma sinodalidade que na Igreja se torna uma profecia social, inspirando novos caminhos também para a política e a economia, a fraternidade e a paz. Algo que acontece por meio de relacionamentos, de viver e testemunhar juntos, de relações autênticas e de vínculos verdadeiros. De fato, “caminhando em estilo sinodal, no entrelaçamento de nossas vocações, carismas e ministérios, e indo ao encontro de todos para levar a alegria do Evangelho, poderemos experimentar a comunhão que salva”.
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1